Crianças e Crack Pref RJ Reportagens 2

Como a mídia em geral vem fazendo matérias contraditórias a respeito do Programa da Prefeitura RJ de Acolhimento de Crianças e Adolescentes Usuárias De Drogas, optamos por agrupar as matérias mais recentes por veículos e não em ordem cronológica. Esperamos assim que cada um dos nossos leitores possa tirar suas próprias conclusões a partir da linha editorial de cada um dos veículos.

A seguir o programa A Liga, veiculado em 27.03.2012 pela TV Band, editado por nós em torno desse programa. O programa completo está na aba a seguir, "Reportagens".
clique na figura para ver o vídeo

Recomendamos também que vejam o programa "Profissão Repórter", veiculado em 02.out.2012, parte 1 e 2, a seguir.
  

Aqueles que desejarem ter acesso a mais documentos, denúncias, vídeos, etc dirijam-se a aba anterior "CRIANÇAS E CRACK Pref. RJ".
Felicidades para todos e obrigado.
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O Dia 21.05.2013
Mais denúncia de violência no Degase
Sete infratores dizem que foram espancados sábado por agentes
Christina Nascimento
Flavio Araújo
Rio - Mais um caso de denúncia de violência contra adolescentes infratores foi registrado numa unidade do Degase (Departamento Geral de Ações Socioeducativas), sábado de madrugada.
Desta vez, teria acontecido no Centro de Internação Dom Bosco, antigo Padre Severino, na Ilha do Governador. Sete menores, entre 16 e 17 anos, dizem que agentes os algemaram, espancaram e, depois, às 5h, os obrigaram a tomar banho de água gelada.
Dois inquéritos foram abertos: um administrativo, pela Corregedoria do Degase, e outro criminal, pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).
Inicialmente, este segundo aponta para lesão corporal. Porém, Márcio Florindo, advogado da família de uma das vítimas, quer que os agentes respondam por tortura.
Os sete menores espancados teriam imobilizado um agente em centro de internação de Belford Roxo e, por isso, acabaram transferidos para a Ilha. Neste local, teriam sido agredidos logo ao chegarem pelos ‘educadores’.
Rigor máximo
Desde domingo, O DIA vem mostrando uma série de denúncias de tortura no Degase, que teriam ocorrido no início do mês e que estão na mira da ALERJ e do Ministério Público.
Horas antes de o caso dos sete jovens ser registrado na DPCA, o diretor do órgão, Alexandre Azevedo, prometera rigor nas investigações.
Ele disse que haverá nas próximas semanas melhorias estruturais e administrativas. Na quarta, inaugurou unidade em Campos, para onde serão transferidos 80 menores.
 “Em julho, inauguraremos outra em Volta Redonda. No ano que vem, já estão orçadas e licitadas algumas na Região Serrana e Niterói / São Gonçalo”.
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JB 17.03.2013
Internação compulsória de crianças usuárias de crack: só 25% de êxito
Levantamento exclusivo no Rio mostra que de 200 acolhidas, só 50 voltaram à vida na sociedade
Maria Luisa de Melo
Às vésperas de completar dois anos, a internação compulsória de crianças e adolescentes no Rio de Janeiro está surtindo pouco efeito na recuperação dos pequenos usuários de crack e outras drogas. Levantamento obtido pelo Jornal do Brasil junto à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social revela que apenas 24,88% das crianças levadas forçadamente para abrigos tiveram êxito no tratamento. Ou seja, das 200 crianças já acolhidas, apenas 50 alcançaram a tão falada reinserção social.
Os dados indicam ainda que outros 59,7% fugiram dos abrigos mantidos pela Prefeitura do Rio para onde foram levados. Outra parcela - 15,42%  - refere-se aos transferidos para abrigos de outras cidades.
Há exatos dois anos, diante do grande número de usuários de crack nas principais vias da cidade, a Prefeitura do Rio começou as ações conjuntas nas cracolândias. Em maio de 2011, deu o pontapé inicial à internação forçada de crianças. Pressionada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que avaliou a medida como ilegal para adultos, a Prefeitura mudou a política de internação forçada e passou a adotar a expressão "internação involuntária" (que prevê laudo médico para justificar a internação). A medida culminou na internação involuntária de adultos logo no início deste ano.
Famílias desestruturadas são o desafio.
Para a diretora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj),  psicanalista Ivone Ponczek, diante do baixo resultado, há que se questionar a abordagem no acolhimento de crianças e adolescentes feito hoje nas ruas da cidade com participação da Polícia Militar.
Psicanalista alerta para necessidade de mudança na abordagem e tratamento de crianças e jovens usuários de crack
"O que vem sendo feito pela Prefeitura é, no mínimo, questionável. Não é fácil recuperar um usuário de drogas, mas a abordagem atual precisa ser questionada. Tratamento não é punição, e a polícia só deve entrar no circuito em caso de clara ameaça de agressão", diz a psicanalista.
Ivone ressalta ainda que o principal desafio para reinserir as vítimas do crack é a situação familiar atípica. "As famílias destas crianças e adolescentes são completamente desestruturadas. É muito difícil recuperar uma criança quando a família não tem base, e têm, muitas vezes, pais também usuários de drogas", alerta.
Para Bernardo da Gama Cruz, psicólogo do Nepad que há sete anos atende exclusivamente adolescentes, a questão da vulnerabilidade social à qual está submetido este grupo de usuários de crack não é o único empecilho para a recuperação dos pequenos.
A cada 200 crianças ou adolescentes internados, apenas 50 se recuperam. Outros 75% fogem
"A internação é uma etapa considerada necessária, um recurso que se pode lançar mão em determinada etapa do tratamento. Mas há a necessidade do tratamento continuar depois da alta. Esta, sem dúvida, é uma grande dificuldade. A desintegração da família, muitas vezes, impede a continuidade do tratamento e isto é extremamente prejudicial", aponta Gama Cruz.
Para o presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren-RJ), Pedro de Jesus, há falhas na política aplicada pela Prefeitura.
"Há uma importância grande na manutenção das equipes multidisciplinares de saúde, com psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, médicos e etc. Já encontramos muitas falhas nos abrigos visitadas logo no início da internação compulsória. Mas hoje não sei se a Prefeitura já fez as mudanças que havia prometido", questiona.
Veja detalhes dos dados divulgados pela Prefeitura:

  • O índice de sucesso corresponde a 24,88%, sendo:
  • Reinserção na família de origem por determinação judicial: 18,41%
  • Reinserção na família de origem sem determinação judicial: 1,99%
  • Reinserção na família extensa por determinação judicial: 1,99%
  • Transferência para família acolhedora por determinação: 0,50%
  • Transferência para outro abrigo após término do acompanhamento: 1,99%
  • O índice de evasão e/ou transferência equivale a 75,12%
  • O índice de insucesso equivale a 59,7% (principal motivo: evasão)
  • Transferência para outro abrigo 15,42% (crianças reencaminhadas para outras cidades e/ou que voltaram para os respectivos abrigos após evasão).
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O Globo 19/12/2012
Crack: 120 crianças estão internadas para tratamento contra o vício no Rio
Justiça dá 1ª decisão favorável a internação compulsória de menor
Ana Cláudia Costa e Renata Leite
Usuários de crack ocupam margens da Avenida Brasil, próximo ao Parque União 
Pablo Jacob / O Globo
RIO - A luta contra o crack não é exclusiva de adultos. No Rio, pelo menos 120 crianças estão atualmente internadas em cinco Centros Especializados de Atendimento à Dependência Química e na Unidade Municipal Casa Viva, em Laranjeiras, segundo dados da Secretaria municipal de Assistência Social. Na quarta-feira, a Justiça se manifestou de forma favorável à internação compulsória de usuários de crack, em decisão do desembargador Paulo Rangel. Ele indeferiu um pedido de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública, que pedia a liberação de uma usuária adolescente. Foi a primeira envolvendo um menor no Rio.
A internação compulsória de menores viciados em crack foi iniciada com base num novo Protocolo de Abordagem Social. As crianças e os adolescentes dependentes da droga são levados para tratamento por assistentes sociais e psicólogos da Secretaria municipal de Assistência Social. Para o órgão da prefeitura, a internação compulsória de menores é a grande responsável hoje pela retirada de menores usuários de crack das ruas, onde vivem vivem em situação de abandono e perigo. Nos abrigos, os viciados recebem atendimento médico e acompanhamento de psicólogos, educadores, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais.
De acordo com a Secretaria municipal de Assistência Social, o município tem hoje 178 vagas nos centros de tratamento. Depois de serem recolhidos e levados para essas unidades, os menores passam por uma avaliação, para que seja identificado o nível do vício de cada um. No período em que permanecem internados nos centros de tratamento, eles passam por exames para se saber se têm algum tipo de doença. É feita ainda uma avaliação nutricional. Outra atividade é um trabalho de reaproximação com os pais e outros parentes. Após o tratamento, o menor só é liberado e volta para casa se ficar comprovado que foi matriculado numa escola.
A internação compulsória de adolescentes usuários de crack está em vigor desde o ano passado. Em outubro deste ano, o prefeito Eduardo Paes anunciou que ampliaria a medida também para adultos, o que gerou polêmica. Em junho de 2011, a Justiça já havia determinado a primeira internação compulsória de um adulto usuário de crack no Rio. Há uma discussão jurídica sobre a constitucionalidade da medida, que o próprio Paes admite ser polêmica.
Viciados agora montam acampamento às margens da Avenida Brasil
O flagelo do crack na cidade fica bem evidente em Ramos, onde usuários da droga montaram um verdadeiro acampamento, com barracas e lonas usadas como abrigos, às margens da pista lateral da Avenida Brasil, sentido Zona Oeste, próximo à Favela Parque União. Os viciados ocuparam um aterro, do canteiro de obras do BRT Transcarioca. No local, eles usam drogas, dormem, comem e tem relações sexuais. Por vezes, invadem a Avenida Brasil, correndo o risco de ser atropelados e de provocar acidentes. Uma faixa da pista, aliás — a que fica junto ao aterro —, foi interditada por cones.
Os usuários se concentravam antes na Praça do Caracol, às margens da Avenida Brigadeiro Trompowsky, via de ligação com a Ilha do Governador. Eles, no entanto, tiveram que deixar a praça às pressas na semana passada, porque um grupo de homens invadiu o local e os agrediu a pauladas. O caso foi confirmado por Paulo Silveira, integrante do movimento “Respeito é bom e eu gosto”. Os mesmos agressores teriam teria jogado uma bomba no local, avisando aos usuários que não queriam mais vê-los na praça.
Antes da agressão, segundo Paulo Silveira, uma equipe de voluntários do seu movimento social esteve na cracolândia e entregou aos viciados camisetas com os dizeres “Eu quero me tratar, mas onde?”.
 
Os agressores levaram todas as camisetas. Um usuário, que se identificou apenas como Miguelzinho, contou que os homens vestiam preto e bateram em todo mundo na cracolândia. Outro viciado disse que o grupo era composto por milicianos. Após o ataque, os dependentes foram para a Favela Parque União, mas, intimidados por traficantes, se transferiram para as margens da Avenida Brasil.
Paulo Silveira disse temer uma chacina na região.
— Acredito que, se a situação continuar como está, é inevitável que uma chacina, no estilo da que ocorreu na Candelária, venha a acontecer nesse local. A aglomeração desses usuários de drogas na região vem incomodando muita gente.
A cracolândia do Parque União, que fica às margens da Avenida Brasil, tem sido alvo constante de operações. Após um mês de ações consecutivas na localidade, foram realizados 657 acolhimentos, sendo 588 adultos e 69 crianças e adolescentes. De acordo com a prefeitura, o trabalho na região vai continuar por tempo indeterminado.
No entanto, as ações do poder público vêm surtindo pouco efeito. Segundo a Secretaria municipal de Assistência Social, apenas 10% dos viciados recolhidos aceitam ajuda. Os outros 90% fogem dos abrigos e voltam às cracolândias. Para dificultar o retorno, os assistentes sociais retiram as roupas, cobertores, cadeiras e outros pertences deixados pelos usuários no momento da fuga.
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O Dia 5.11.2012
ONG de 'matador' tem contrato de R$ 34 milhões em Guapimirim
Casa Espírita Tesloo tem contrato para fornecer funcionários — são 280 — para a prefeitura de Guapimirim
Rio -  Muito além da filantropia. Cuidar dos enfermos e desamparados deixou de ser a única especialização da Casa Espírita Tesloo. Presidida pelo rei dos confrontos armados do Rio — o major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães —, a organização pulou a cerca da utilidade pública e abocanhou outro contrato milionário: além dos três convênios com a Prefeitura do Rio para cuidar dos menores abandonados e famílias em situação de risco, a ONG é responsável por treinar e fornecer mensalmente um corpo de 280 funcionários à Prefeitura de Guapimirim.
Um contrato que ultrapassa os R$ 34,8 milhões e entrou na lista dos negócios suspeitos da Prefeitura de Guapimirim, investigados pelo Ministério Público e pela Polícia Civil na Operação ‘Os Intocáveis’. O trabalho levou à cadeia por irregularidades e desvio de verbas públicas, em agosto, o então prefeito Renato Costa Mello Júnior, o Júnior do Posto, dois secretários e o presidente da Câmara de Vereadores, Marcelo Emerick (PPS), o Marcelo do Queijo.
O convênio com a Tesloo, por 12 meses, foi publicado no Diário Oficial de Guapimirim no dia 5 de janeiro deste ano e prevê que a casa espírita forneça mão de obra “técnica especializada para todas as secretarias municipais”. Os serviços são os mais diversos: desde gente para o quadro administrativo e de apoio nas escolas e creches até os garis e motoristas, além de gerentes e pessoal de suporte contábil e jurídico.
O valor mensal do contrato da Tesloo alcança os R$ 2,9 milhões — média de R$ 10,3 mil por funcionário — e prevê o pagamento pela hora trabalhada. No caso de motorista, por exemplo, o município desembolsa R$ 13,93 a hora - o que equivaleria a um salário fantástico de R$ 111,44 pelo dia com oito horas de serviço.
O atual secretário de administração de Guapimirim, Fernando Braga, admitiu que não sabe os valores pagos aos servidores pela Tesloo. “Não sei. O garis fazem muita hora-extra. Se o valor é muito alto, é por causa dos encargos sociais que estão embutidos no contrato”, acredita Braga. Os garis, como os motoristas de Guapimirim, dizem que recebem bem menos: R$ 1 mil por mês.
Secretário justifica valores elevados
O secretário de administração Fernando Braga admite que o contrato com a Tesloo foi uma espécie de máscara para terceirizar o funcionalismo público. Era para atender a exigência do Ministério Público — de regularizar os funcionários contratados sem concurso ou vínculo empregatício.
Sobre os valores elevados do contrato com a Tesloo, o secretário justifica o volume generoso de recursos com o pagamento dos encargos trabalhistas. “Não é só o salário, tem INSS, FGTS e outros custos”, analisa Braga, que não soube precisar o total gasto com os demais servidores do município.
A investigação da Delegacia de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco) listou as contratações como suspeitas de fraude. Na apuração, alega que o prefeito Júnior do Posto, inclusive, desviava das funções os funcionários terceirizados. Um deles era lotado na padaria suspeita de ser fachada para a fraude na compra de farinha.
 Operação em agosto prendeu o prefeito Junior do Posto, dois secretários e o presidente Câmara de Vereadores | Foto: Osvaldo Praddo / Agência O Dia
As irregularidades encontradas na prefeitura de Guapimirim incluíam o superfaturamento nos preços. O caso da compra de carnes para a merenda escolar que, além de cara, nem sempre terminavam na dispensa das creches e escolas, mas em açougues do município. As fraudes, ainda em apuração, envolvem 16 pessoas e o grupo é acusado de desviar, através de licitações fraudulentas, mais de R$ 1 milhão por mês.
TERRENO E MÓVEIS DOADOS
As amizades que movem barreiras. A apuração da ligação com a milícia de Sulacap e Magalhães Bastos do major reformado Sérgio Magalhães traz à tona o Centro Poliesportivo Tenente-Coronel Garcia. Presidida pelo colega de farda, o sargento Ipólito Pereira Campos, a área esportiva fica dentro da área do Batalhão de Cavalaria de Guarda, na Vila Militar.
O Exército assinou, em 2003 e renovou até 2013, o contrato de “Cessão de Uso Não Oneroso” para a comunidade ter uma opção de lazer. Realmente foi erguido um campo de futebol e uma área para atividades comunitárias, além de cursos básicos. Mas uma faixa generosa do terreno ganhou um lava a jato, que não faz parte do contrato.
Os negócios tocados pelo major Sérgio Magalhães — autor de 42 mortos em supostos tiroreios —, também deram à Tesloo frutos e bondosas doações. A maior veio da Agência Nacional do Cinema (Ancine): foram R$ 272 mil em diversas mobílias fornecidas à Casa Espírita, em outubro do ano passado, logo após a extensão do contrato da ONG com a Prefeitura do Rio. O negócio foi assinado pelo diretor-presidente da agência, Manoel Rangel Neto.
Outra doação à casa espírita veio da Prefeitura do Rio. De acordo com o levantamento do Tribunal de Contas do Município, a Tesloo ganhou uma lista interminável de material permanente para servir os centros de atendimento aos dependentes químicos. Só tem um pequeno detalhe: não há nenhuma cláusula no contrato com o termo de doação. Ao TCM, a Secretaria Municipal de Assistência Social respondeu que a Tesloo deve apresentar, ao final do contrato, o termo de compromisso em devolver o material à prefeitura. 

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O Dia 30.10.2012
Convênio com ONG de matador é encerrado
Após escândalos noticiados pelo DIA outra instituição assume nesta terça-feira abrigos, com corpo técnico da Tesloo, para cuidar de jovens dependentes por 180 dias
JOÃO ANTONIO BARROS
Rio -  A Prefeitura do Rio deu o primeiro tiro nos contratos da ONG do major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães Júnior. A Secretaria Municipal de Assistência Social retirou nesta segunda-feira das mãos da Casa Espírita Tesloo o gerenciamento dos cinco centros para tratamento de 160 crianças e adolescentes dependentes químicos.
O fim do convênio não encerra o atendimento aos menores abrigados: outra instituição filantrópica assume hoje, em caráter emergencial, os espaços físicos dos abrigos e o corpo técnico da Tesloo para cuidar dos jovens pelo prazo de 180 dias.
Pega de surpresa com o escândalo envolvendo o presidente da casa espírita — como O DIA revelou, Sérgio Magalhães é investigado por ligações com o grupo de milicianos de Sulacap e matou 42 pessoas em supostos tiroteios —, além do pedido do Tribunal de Contas do Município para não renovar os contratos com a Tesloo, a Prefeitura do Rio foi obrigada a intervir e passou os últimos cinco dias procurando outra ONG para manter o atendimento às vítimas das drogas, principalmente do crack.

Usuários consomem crack em frente ao Parque União, na entrada da Ilha do Governador
Foto: Alexandre Brum / Agência O Dia
Outros contratos de R$ 80 milhões
O contrato da Secretaria de Assistência Social com a Tesloo para gerir os cinco centros para dependentes químicos começou em 2009 e previa o pagamento de R$ 7,5 milhões para atender 160 menores.
Outros convênios com a prefeitura, desde 2005, somam R$ 80 milhões de repasses à ONG, que ainda detém quatro contatos, no valor de R$ 40 milhões, para ajudar na gestão de abrigos a menores e em ações sociais com famílias vitimizadas.
Apesar de receber em média R$ 28 mil por menor em 2011, o serviço da Tesloo foi reprovado nas inspeções feitas pela Comissão de Direitos Humanos da Alerj e do Ministério Público.
Falta de funcionários especializados e superfaturamento nos preços de alimentos e produtos de limpeza são falhas constantes anotadas nas fiscalizações.
O relatório do MP destacou que os técnicos não tiveram acesso ao cardápio impresso nos abrigos, não havia frutas, legumes ou carnes na despensa no dia da inspeção e o almoço servido era de feijão, arroz, angu e moela de frango.
Entre os problemas anotados, o MP destaca a prescrição igual de remédios para todos os internos e a repetição da receita por longos períodos sem avaliação clínica. E conclui que a Tesloo tem ‘apresentado histórico de dificuldade para cumprir a legislação’.

Contrato foi feito  sem licitação pública
O contrato da Tesloo não renovado pela Prefeitura do Rio foi firmado sem licitação pública, em outubro de 2009. No primeiro momento, era apenas para cuidar de 20 meninos e 40 meninas usuários de drogas.
Em setembro do ano passado, ganhou reforço fenomenal: passou para 160 menores atendidos, em virtude da intensificação do combate ao crack.
O aumento na demanda esbarrou na ineficiência do serviço. A ponto do Ministério Público pedir numa ação civil pública a redução no número de menores abrigados num dos centros — a Casa Ser Criança — para os iniciais 20 meninos, ao invés dos 40 que atualmente são atendidos.

Cardápio inadequado
Os técnicos do Ministério Público detectaram uma série de irregularidades nos centros administrados pela Tesloo. A falta de capacitação dos funcionários, crianças sem escola e instalações precárias foram unânimes nos cinco abrigos.

Foto: Reprodução
Até a rotatividade de pessoal, provocada pelo atraso no pagamento, e a falta de fiscalização da Prefeitura do Rio foram diagnosticados pelo MP.
Chamou atenção a falta de carnes e frutas no cardápio e, na falta de médico, a repetição da receita médica — sempre com remédios psicotrópicos. Na ação civil pública, em agosto deste ano, a promotora Karina Fleury pede a proibição no aumento de vagas e que limite o atendimento de jovens nos centros especializados no tratamento químico.
Arte: O Dia
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Internos sofrem castigos físicos e químicos em centro administrado pela Tesloo
JOÃO ANTONIO BARROS
Rio -  "Chegou o bombeiro, chegou o bombeiro! Vamos acordar!" Os gritos, seguidos de baldes de água fria lançados sobre o rosto das crianças, funcionam como despertador para os 44 meninos internados na Casa Ser Criança, em Guaratiba.
Em um dos cinco centros de atendimento a dependentes químicos administrados pela Casa Espírita Tesloo, o batismo matinal serve como recado para os jovens não demorarem a sair da cama, como lembra o estudante C., 13 anos.
A lição foi tirada dos três meses que passou internado na ‘casa do terror’, como internos chamam o abrigo, aonde o menor chegou para se livrar do vício da cocaína e aprendeu que a desobediência poderia levá-lo a receber castigos físicos.
 Casa Ser Criança, em Guaratiba, pertence à Tesloo | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Nenhuma moleza para C., que acordava entorpecido por um coquetel de quatro a cinco remédios — dois deles ingeridos à noite — e viu um colega ser amarrado e lançado na piscina como sanção por atraso. Não morreu por sorte.
Desacordado, teve que ser levado ao posto de saúde do bairro. A reclamação dos pais, desta vez, fez a direção da clínica se mexer, como lembra Monique Barbosa, mãe do menino J., que aos 11 anos passou pelo abrigo: “Transferiram o funcionário para outro setor e esvaziaram a piscina”.
As histórias da "falta de jeito" em lidar com menores usuários de drogas ilustram a ação civil pública que a defensora Eufrásia Souza, da Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, move na Justiça do Rio contra a internação compulsória.
“Falta gente especializada”, detalha Eufrásia, que numa visita aos centros gerenciados pela Tesloo se impressionou ao ver jovens dopados estirados no chão. Cobrou uma explicação do enfermeiro e soube que o psiquiatra da ONG prescreveu os remédios e, o mais surpreendente, por telefone.
“Só há um psiquiatra para todos os abrigos. Ele passa uma vez por semana em cada um. Na emergência, os enfermeiros ligam e ele passa o remédio”, informa a defensora. O chamado SOS — doses elevadas de tranquilizantes — também é ministrado como castigo para os fujões.
A constatação aparece no relatório da inspeção feita pela comissão multidisciplinar, a pedido da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa.
Além de administrar os mesmos remédios a todos os pacientes, eles detectaram que, nos casos de fugas e ‘rebeldia’, os menores recebiam duas injeções de Haldol (antipsicótico) e Fenergam (antialérgico). É o castigo químico.
 
Acolhimento compulsório é criticado pela defensora Eufrásia de Souza: "Falta gente especializada" 
Foto: Alexandre Vieira / Agência O Dia

Menores em abrigo não frequentam escolas
Enquanto sobram lições de abuso, falta frequência escolar aos menores abrigados nos centros da Casa Espírita Tesloo. De acordo com a defensora Eufrásia de Souza, poucos são os menores em tratamento de desintoxicação matriculados na rede pública, apesar de a internação dos jovens durar no mínimo três meses.
Obrigar a matrícula de todos os abrigados faz parte da carta de exigências proposta em ação civil na Justiça pela promotora Karina Fleury, da Vara da Infância e Juventude da Capital. A Tesloo nega os casos de maus-tratos e a administração generalizada de medicação, além das falhas na educação.
Histórico conturbado
A Casa Espírita Tesloo é presidida pelo major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães Júnior, o xerife do recolhimento compulsório. Levantamento do DIA mostrou que o oficial participou das mortes de 42 pessoas entre 1999 e 2002, ocorridas em supostos tiroteios com bandidos.
Os laudos cadavéricos das vítimas apresentam sinais de tiros disparados a curta distância na cabeça e peito. O oficial é investigado na 33ª DP (Sulacap) por envolvimento com o grupo de milícia de Magalhães Bastos e Sulacap. Sérgio nega a suspeita e diz que as mortes foram em legítima defesa.

 
Relatório relata punições sofridas por internos | Foto: Reprodução

Relatório lista punições
O relatório da Comissão de Direitos Humanos da Alerj aponta que, em caso de fuga, os menores atendidos nos centros administrados pela Tesloo são castigados. Uma das "penas" é a aplicação de injeção com o chamado "SOS".
A medicação, que faz os jovens dormirem até por um dia inteiro, é prescrita pelo psiquiatra, que normalmente aparece nos abrigos uma vez por semana. Mas foram verificados casos de que os jovens têm os pés e as mãos amarrados.
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Contrato de ONG de matador não será renovado
Prefeitura segue orientação do TCM sobre a Tesloo
JOÃO ANTONIO BARROS
Rio -  Com os dias contados. A Secretaria Municipal de Assistência Social vai seguir a recomendação do Tribunal de Contas do Município para não renovar nem assinar novos contratos com a Casa Espírita Tesloo. A única indefinição é o destino dos 160 meninos e meninas atendidos nos cinco centros de atendimento a dependentes químicos.
Como o contrato, no valor total de R$ 7.556.000, expira na próxima segunda-feira, a Prefeitura do Rio estuda uma solução para manter os jovens em tratamento.
Nesta sexta-feira, o corpo jurídico e técnico da secretaria passou o dia reunido tentando saídas para manter os menores abrigados. Um das alternativas é selecionar novas instituições religiosas, mas esbarra na falta de vagas disponíveis. Outra saída seria manter a Tesloo por um período curto até selecionar o novo parceiro.
A Casa Espírita Tesloo é presidida pelo major reformado da PM Sérgio Pereira, que matou 42 pessoas em confronto com supostos bandidos | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Neste caso, usaria o argumento jurídico de não causar prejuízo às crianças para driblar temporariamente a decisão do TCM. A Casa Espírita Tesloo é presidida pelo major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães Júnior, que entre 1999 e 2002 matou 42 pessoas em confronto com supostos bandidos.
Como O DIA denunciou, em alguns casos as vítimas apresentavam sinais de tiros a curta distância na cabeça e no peito. A ONG tem outros quatro contratos em vigência com a Prefeitura do Rio, no valor de R$ 30 milhões. Outros três convênios, no valor total de R$ 15,6 milhões, já foram concluídos, mas não terminou a prestação de contas.
A recomendação do TCM é para impedir a prefeitura de renovar ou assinar novos contratos até o fim da auditoria nas contas apresentadas pela Tesloo.
Na análise preliminar, os técnicos do tribunal verificaram indícios de superfaturamento de preços e serviços contratados que deixaram de ser realizados.
Um dos itens que chamaram a atenção foram os aluguéis pagos pelas casas onde funcionam os centros da ONG. Apesar de localizadas em bairros pobres da Zona Oeste, os valores chegam a R$ 13 mil.
Fim das verbas e multa se exigências forem ignoradas
Termina no fim de novembro o prazo de 90 dias para que o Município do Rio de Janeiroe a ONG Casa Espírita Tesloo se adequem às exigências para o atendimento aos menores usuários de drogas acolhidos nos cinco Centro de Apoio ao Dependente Químico (CADQ).
Caso as adequações não sejam cumpridas, a Justiça determina a suspensão do repasse das verbas e multa diária de R$ 1 mil. As instituições estão vinculadas à ONG, com verba repassada pelo município. A prefeitura recorreu.
Abrigos funcionam em casas alugadas por valores superiores aos de mercado. Além disso, alguns contratos não foram apresentados ao Tribunal de Contas do município | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Ação Civil Pública foi impetrada em agosto pela promotora Karina Fleury, da 7ª Promotoria da Infância e Juventude, com base em vistoria feita com equipe do MP.
Segundo a promotora, a Tesloo precisa, entre outras exigências, fazer o plano individualizado de cada criança e 100% do atendimento de Saúde Mental e na rede pública de ensino. Cabe ao município fiscalizar e avaliar o cumprimento dos termos do convênio.
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ONG de matador recebe R$ 28 mil por viciado em crack internado
Dono da Tesloo diz que matou 42 em legítima defesa
JOÃO ANTONIO BARROS
Rio -  As casas amplas, bom quintal, mas com aspecto de abandono, paredes descascadas e desbotadas, localizadas em bairros pobres do Rio de Janeiro ganharam perfil de Zona Sul. Pelo menos na planilha da Casa Espírita Tesloo. Na prestação de contas à Prefeitura do Rio de Janeiro, a ONG justificou o pagamento mensal de R$ 13 mil com o aluguel de três humildes imóveis onde funcionam os centros especializados de atendimento à dependência química, em Guaratiba. No bairro de Cinco Marias — onde estão os abrigos — uma residência simples e espaçosa custa R$ 60 mil e os aluguéis nunca ultrapassam os R$ 1 mil. E olha que a prefeitura paga — e muito — para cuidar das crianças e adolescentes vítimas das drogas: só no ano passado desembolsou R$ 3,5 milhões — em média R$ 28 mil por menor — à Tesloo.
A suspeita de irregularidades nos aluguéis dos imóveis — onde nem o contrato de locação foi apresentado — e o elevado custo para manter as crianças nos abrigos foram algumas das razões que levaram o presidente do Tribunal de Contas do Município, Thiers Vianna Montebello, a recomendar esta semana à Secretaria Municipal de Assistência Social que não faça novos contratos e nem renove os atuais convênios mantidos com a Casa Espírita Tesloo.
O prazo é até a conclusão da auditoria nas contas da ONG, presidida pelo major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães Júnior — um recordista em autos de resistência e que acumula 42 mortes em confronto com supostos bandidos, como O DIA mostrou ontem com exclusividade.
Os contratos da Tesloo com a Prefeitura do Rio, todos sem licitação, somam R$ 80 milhões desde 2005. Oito estão em vigência e, destes, três, em fase final, ainda dependem da prestação de contas.
O relatório do TCM indica irregularidades em quase todos os convênios firmados para administrar os centros de acolhimentos de dependentes químicos, como superfaturamento em alimentos e nos produtos de limpeza e higiene. Há suspeita do uso de recibos falsos para encobrir desvios de verba, como a compra de cinco molhos de salsa por R$ 64,50, e possíveis notas fiscais frias — emitidas pela Cerealista Amazonas Ltda com a descrição de produtos que ela nunca comercializou.
A análise dos técnicos do TCM mostram que a Casa Espírita Tesloo apresenta custo incompatível com os serviços prestados. E anexam a vistoria feita pela Prefeitura do Rio nos abrigos de Guaratiba e Campo Grande, quando diagnosticou a falta de prontuários e guias de recolhimento atualizados dos menores internados, ausência de médicos listados como funcionários e a precária manutenção dos prédios e do mobiliário dos centros.
Freixo critica falta de profissionais do ramo na ONG
A reportagem de O DIA, com a denúncia do envolvimento do major reformado Sérgio Pereira de Magalhães Júnior na morte de 42 pessoas em supostos confrontos, repercutiu ontem na Assembleia Legislativa. O presidente da Comissão de Direitos Humanos, o deputado Marcelo Freixo (Psol) considera que a Tesloo, apesar de gerir cinco centros especializados em dependência química, é dirigida por pessoas sem especificidade e sem quadro técnico compatível com a necessidade do enfrentamento ao crack.
“Não é um valor pequeno (contratos entre a ONG e a prefeitura). Tudo se justifica pelo drama que o crack representa aos olhos da opinião pública. E não se pode justificar tudo em função do dano causado por uma droga — não há nem um estudo que aponte o número de pessoas viciadas em crack no Rio, hoje”, criticou, em plenário.
Abrigos funcionam em casas alugadas por valores superiores aos de mercado. Além disso, alguns contratos não foram apresentados ao Tribunal de Contas do município
Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Para a deputada Janira Rocha (Psol), a política de internação compulsória de jovens usuários de drogas é “fachada para a higienização da cidade”. Segundo ela, a Secretaria de Assistência Social exibiu pesquisa mostrando que 18% dos jovens recolhidos nas ruas eram usuários de drogas. Janira revelou que o governo empregou este ano menos da metade da verba destinada ao tratamento de dependência química. “Dos R$ 29 milhões aprovados, 36% foram usados, segundo alertou o deputado André Corrêa em debate no plenário. E para 2013, a proposta orçamentária do governo é reduzir 40% da verba”, afirmou ela.
Recadastramento virou apenas um relatório
Um dos convênios da Tesloo na lista negra do Tribunal de Contas não é sobre atendimento a usuários de drogas, mas para a atualização de 408 mil famílias do cadastro único, feito pela prefeitura dos programas sociais do governo federal, como o Bolsa Família. A ONG, que nunca prestou este tipo de serviço, ganhou o contrato de R$ 9.687.841,10, em setembro de 2011. Após sete meses do prazo final da entrega dos documentos, a Tesloo enviou apenas um relatório incompleto e com menos da metade da tarefa realizada. Não constava nem a quantidade de funcionários contratados para a execução do trabalho.
Major alega que matou 42 em legítima defesa
O major reformado Sérgio Magalhães alegou ontem que as 42 mortes citadas na edição do DIA ocorreram em confronto e que agiu em legítima defesa. Garantiu que na 33ª DP (Realengo) ratificou sua posição contrária à ação de milícias e que criou a Tesloo para ajudar a reverter o “quadro degradante da dependência química” no Rio. Sobre a orientação do TCM para a prefeitura não renovar os contratos com a Tesloo, a ONG explicou que não se pronunciará enquanto não for notificada pela Secretaria de Assistência Social. Ontem, o prefeito Eduardo Paes não quis comentar a reportagem.
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Dono de abrigos do crack já matou 42
Presidente de instituição que recebe verba pública para gerir centros para dependentes químicos, major reformado da PM tem no currículo tiroteios que levaram 42 à morte em três anos.
JOÃO ANTONIO BARROS
Rio -  Os tiros a curta distância na cabeça e no antebraço de dois adolescentes, de 16 e 17 anos, mortos num suposto tiroteio, há 12 anos, sintetizam bem o histórico profissional do homem contratado pela Prefeitura do Rio para cuidar de 178 jovens usuários de crack. No caminho inverso do filantropo presidente da Casa Espírita Tesloo — a cogestora dos cinco centros especializados em dependência química —, os anos de serviço na Polícia Militar fizeram do major reformado Sérgio Pereira de Magalhães Júnior, 42 anos, um colecionador de confrontos armados. Em quatro anos de combate nas favelas, o oficial viu tombar nos tiroteios que protagonizou ao menos 42 pessoas, entre 1999 e 2002.
 
Sede da Tesloo: fundada em 2002 por um grupo de amigos e parentes do major Magalhães | Foto: Carlo Wrede / Agência O Dia
A fama de operacional e destemido valeu a Sérgio Magalhães o título de ‘xerife’ de Magalhães Bastos, onde foi criado e montou a base para seu serviço social. A reboque, virou alvo de investigação, determinada pela Chefia de Polícia Civil em 2008, por suspeita de integrar grupo de milícia na Zona Oeste. O major foi ouvido duas vezes em inquérito na 33ª DP (Sulacap) para apurar a ligação de policiais com grupo que domina as comunidades Sobral e Vila Brasil.
Na lista dos investigados, há três velhos conhecidos de rua do major Júnior — como Sérgio Magalhães aparece na denúncia e, curiosamente, é chamado pelos amigos no bairro. São eles os irmãos Ítalo e Ipólito Pereira Campos, e Jailton Campos, todos PMs e que participaram de mais de uma dezena de trocas de tiros com supostos traficantes, sempre sob a supervisão do oficial, nos tempos de 22º BPM (Maré) e 14º BPM (Bangu).
 Nem todos os usuários de crack são atendidos nos abrigos. Só os que querem receber ajuda clínica | Foto: Carlo Wrede / Agência O Dia
Sérgio Magalhães e os irmãos Campos formaram uma trinca do barulho nos quartéis e com um gosto pelo atacado: dos 23 autos de resistência registrados pelo major PM nas delegacias do Rio de Janeiro e batalhões onde trabalhou, em pelo menos um terço houve mais de uma vítima. Em um só episódio, na Favela da Coreia, em 2001, foram cinco mortes. E mais: a precisão dos tiros do oficial é impecável. Quase sempre os supostos criminosos foram atingidos na cabeça e no peito.
Rápido no gatilho
A rapidez com o gatilho nas operações policiais se mostrou eficiente também na administração da Casa Espírita Tesloo. Sérgio fundou a instituição em 2002 com um grupo de amigos e parentes. Até hoje, a mãe do oficial e o irmão, cabo da PM, têm cargos na ONG e a mulher, Sabrina Fernandes, faz parte do grupo administrativo.
Em três anos, Sérgio Magalhães fincou o pé na Prefeitura do Rio e não saiu mais.
Mesmo sem qualificação, conseguiu angariar R$ 1,8 milhão em verbas para cuidar dos menores abandonados e famílias desamparadas. Mas o pulo do gato veio mesmo em 2009. De lá para cá, o combate ao crack e o acolhimento de crianças e adolescentes injetaram R$ 78 milhões na casa espírita e deram ao major o título de rei da internação compulsória.
Reforma por invalidez não freou troca de tiros
Amigos em Magalhães Bastos e na Justiça. Ítalo e Ipólito Campos são testemunhas em ação na 4ª Vara de Fazenda Pública em que o major pede à PM o reconhecimento da reforma por doença adquirida no trabalho. Magalhães alega que em operação na Favela Nova Brasília, em 2003, caiu de uma casa e feriu duas vértebras. Parecer do setor de neurocirurgia do Hospital da PM, assinado pelo urologista Frederico Antônio Capper, atestou invalidez permanente.
O problema cervical, no entanto, não o impediu de entrar em favela e atirar em bandidos. Em 2007, foi chamado em casa por amigo, de madrugada, e foi sozinho à Favela do Fumacê, em Realengo, recuperar carro roubado. Na 33ª DP, Magalhães afirmou que só rumo à delegacia notou o corpo de um homem no banco traseiro. Em 2011, saiu de moto e recuperou veículo de outro amigo, em Deodoro. Na ação, trocou tiros com Patrick da Silva e Silva, que morreu com duas balas na cabeça.
Tiros certeiros na cabeça e no peito
Nos laudos cadavéricos dos mortos em confronto com o major, mais de 60% das vítimas foram atingidas na cabeça, no peito e no antebraço. As marcas sinalizam tentativa da vítima de se defender com o braço diante da arma. Foi o que aconteceu com Leonardo Mendonça Leocádio, 16 anos, e Juliano Domingos Monteiro, 17, mortos na Favela 48, em Bangu, em 2000. O primeiro levou três tiros no pescoço, um na cabeça e quatro no braço direito. O amigo, dois no peito e dois no braço direito.
A maioria das 42 mortes ainda são investigadas nas delegacias ou no Ministério Público: seis viraram inquéritos arquivados e 23 desses autos de resistência, elogio na ficha funcional.
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Nossos comentários a respeito da matéria a seguir publicada pelo jornal O Dia
Prefeitura maquia resultados de seu programa de internação compulsória de crianças e adolescentes.
Algumas reflexões sobre os dados fornecidos pela Prefeitura do seu programa de internação compulsória de crianças e adolescentes SUPOSTAMENTE usuárias de crack e publicados na matéria do Jornal O Dia a seguir.

1.      De acordo com a Resolução SMAS Nº 20 de 27.05.2011 que criou e regulamentou o programa em questão (http://doweb.rio.rj.gov.br/sdcgi-bin/om_isapi.dll?&softpage=_infomain&infobase=30052011.nfo) seu objetivo era: 

Art. 3º - São objetivos do Serviço Especializado em Abordagem Social:
I - construir o processo de saída das ruas e possibilitar condições de acesso à rede de serviços e benefícios assistenciais;
II - identificar famílias e indivíduos com direitos violados, a natureza das violações, as condições em que vivem, estratégias de sobrevivência, procedências, aspirações, desejos e relações estabelecidas com as instituições;
III - promover ações de sensibilização para divulgação do trabalho realizado, direitos e necessidades de inclusão social e estabelecimento de parcerias;
IV - promover ações para a reinserção familiar e comunitária.

Sendo assim, esse programa deve ser avaliado a partir do universo de jovens que foram encontrados pela Prefeitura nas ruas da cidade (690 jovens) e qual o resultado obtido em relação a todos eles (50recuperados”), o que representa uma taxa de 7% de o objetivo do programa fosse somente afastá-lo do uso abusivo de drogas.
Como o objetivo do programa era a reinserção social e familiar e somente 20% voltaram ao convívio familiar e não temos notícias quanto aos demais, o resultado do programa fica ainda mais comprometido.

2.      Se levarmos em consideração que uma pesquisa realizada pela própria SMAS com as crianças e adolescentes internadas pela Prefeitura somente 18% era usuária de crack (ver quadro a seguir), o que representa 36 indivíduos num universo de 201 internos, sendo que alguns dos internos jamais consumiram droga alguma, sendo lícita ou ilícita, é impossível avaliarmos o resultado de tal programa a partir dos dados constantes na matéria em questão e aqui transcritos.

3.      Por fim, é importante realçar que uma norma internacional determina que programas de reinserção social e/ou de acolhimento de usuários de qualquer tipo de droga seja feito somente após 5 anos o término do processo de intervenção junto ao indivíduo, período necessário para que o processo se consolide efetivamente. Como esse programa da Prefeitura foi implantado em 31 de março de 2011, é impossível avaliar seus resultados nesse momento.
         Sem mais, atenciosamente,
Paulo Silveira

O Dia 24.10.2012
Programa tirou do vício 25% de jovens internados
Para especialistas, preocupante é o baixo índice dos que voltaram para as famílias: 20%
FRANCISCO EDSON ALVES / VANIA CUNHA
Rio -  Enquanto a discussão da internação involuntária de adultos viciados em crack gera polêmica, o sucesso na recuperação de crianças e adolescentes usuários de crack levados para tratamentos contra a vontade nos cinco Centros Especializados de Atendimento à Dependência Química da prefeitura é de 25%.
Dos 201 menores de 18 anos já acolhidos compulsoriamente entre maio de 2011 até agosto deste ano, segundo a Secretaria Municipal de Assistência Social, 50 conseguiram se livrar do vício. O índice é considerado razoável por especialistas. O preocupante, porém, é que somente 20% deles — com e sem determinação judicial —, voltaram para suas famílias.
Nesta terça-feira, a proposta do prefeito Eduardo Paes de internação compulsória, como O DIA  mostrou com exclusividade na sexta-feira, voltou a dividir opiniões.
Desde 2011, em 104 ações, 4,3 mil adultos e 690 crianças foram acolhidos no Rio | 
Foto: Osvaldo Praddo / Agência O Dia
A prefeitura afirmou que irá recorrer a lei federal que permite a internação de adultos com base em laudos psiquiátricos. Iniciativa semelhante está em teste em Maceió, Alagoas, mas lá os pacientes têm que ter autorização das famílias.
“O índice de 25% de sucesso não é ruim, levando-se em conta que a porcentagem considerável é de 30% em relação a drogas em geral”, afirmou Jairo Werner, doutor em saúde mental e coordenador do premiado projeto Restaurando Esperança, do Instituto de Pesquisas Heloisa Marinho (Iphem).
Segundo a Secretaria de Assistência Social, o índice de evasão e transferências dos menores dos centros de atendimentos chegou a 75% desde o ano passado. A secretaria não informou, no entanto, qual o tempo médio de internação de meninos e meninas, alegando que ‘depende de cada caso’.
Nos cinco centros municipais existem hoje 178 vagas disponíveis para internações para crianças e adolescentes. Desde março do ano passado, foram acolhidos 690 jovens. Apesar da quantidade, atualmente 123 estão internados.
Lei prevê internação forçada com laudos
A prefeitura vai se basear na Lei Federal 10.216, que permite, através de laudo psiquiátrico, internação de adultos viciados. Há três tipos de internações: voluntária (por vontade própria), involuntária (sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiros) e compulsória (determinada pela Justiça).
“Em crise, o usuário não consegue tomar decisões”, alega Eduardo Paes. Dario Sousa, especialista em Sociologia Urbana da Uerj, classifica a iniciativa como ‘política cínica e desumanizadora’, que pode abrir ‘precedentes perigosos’.
“Em outras situações, o prefeito poderá se achar no direito de tomar decisões pelos cidadãos”, justifica Sousa. Beatriz Adura, psicóloga e integrante da Frente Estadual de Drogas e Direitos Humanos e do Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial, também protesta.
“A Lei é clara: a internação, em qualquer modalidade, só é indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Querem passar com a carroça na frente dos bois”.
Margarida Pressburger, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, por sua vez, diz ser a favor da internação involuntária. “Algo tem que ser feito. Mas tem que haver estrutura de saúde melhor”.
Especialista no tratamento de dependentes químicos, Analice Gigliotti não é contra a medida, mas ressalta que é preciso oferecer bom tratamento aos pacientes. “A cada 15 pessoas internadas, é preciso dois a três psicólogos, um médico de plantão por dia, no mínimo dois enfermeiros”, enumera.
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O Globo 25.10.2012
ONG que mantém abrigo contra crack não pode renovar contrato
TCM suspeita de irregularidades nas contas. Responsável é PM investigado por crimes
Luiz Ernesto Magalhães
RIO — A prefeitura do Rio se vê diante de um impasse para manter abertas 160 das 178 vagas que dispõe em abrigos especializados para tratar de crianças e adolescentes viciados em crack — ou seja, 90% do total. O contrato da Secretaria municipal de Assistência Social com a Casa Espírita Tesloo, que oferece as vagas em cinco unidades, vence na próxima segunda-feira e não será renovado. A ONG é alvo de uma inspeção especial do Tribunal de Contas do Município (TCM) por causa de suspeita de irregularidades na prestação de contas e da qualidade dos serviços oferecidos aos menores. Por essa razão, o TCM encaminhou na última terça-feira ofício à prefeitura recomendando que não renove contratos da entidade até a conclusão das investigações.
Na quinta-feira, o jornal “O Dia” revelou que a entidade é dirigida pelo major reformado Sérgio Pereira de Magalhães Júnior. O oficial é citado em 23 autos de resistência que resultaram em 42 mortes durante operações em áreas carentes, entre os anos de 1999 e 2002. Na da 33ª DP (Realengo), há um inquérito que investiga o suposto envolvimento de Sérgio Pereira com milícias. Procurado pelo GLOBO, o major reformado não retornou as ligações.
A Secretaria de Assistência Social havia marcado uma concorrência entre entidades sem fins lucrativos para garantir a manutenção das 160 vagas em abrigos justamente para a segunda-feira — as 18 vagas restantes para os menores são em instalações próprias do município. As entidades selecionadas deverão precisar de algum tempo para se preparar, mas pela decisão do TCM, o contrato atual com a Tesloo sequer poderia ser prorrogado. Em meio ao impasse, a prefeitura busca uma alternativa para evitar a descontinuidade no atendimento.
Segundo levantamento da vereadora Andrea Gouvea Vieira (PSDB), a Tesloo firmou contratos no valor de R$ 79,8 milhões com a prefeitura desde 2005, dos quais já foram pagos R$ 42,5 milhões. Hoje a Casa Espírita Tesloo mantém cinco contratos com a prefeitura administrando direta ou indiretamente 310 vagas para menores de rua. Deste total, 150 em contratos que só vencem em 2014. Além das 160 vagas para dependentes de crack, oferece mais 52 em abrigos para adolescentes e crianças que não usam a droga.

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Agência Brasil - 27/08/2012

Denúncia reacende debate sobre internação compulsória de usuários de drogas

As recentes denúncias sobre o tratamento inadequado de crianças e adolescentes usuários de drogas, em quatro abrigos do Rio de Janeiro, reacendeu a antiga polêmica em torno do modelo ideal de tratamento. De um lado, alguns especialistas temem o retorno do modelo manicomial para usuários de drogas. De outro, psiquiatras e representantes do governo justificam a necessidade da internação involuntária.
Para alguns especialistas, o tratamento involuntário de crianças e adolescentes usuários de drogas, como do crack, é uma alternativa legal necessária. O psiquiatra Marcelo Ribeiro, professor do Departamento de Psiquiatria da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), acredita que a internação involuntária é a saída para algumas situações em que o usuário de droga perde o discernimento e a capacidade de decisão.
“O que existe é uma parcela de pessoas que tem problema agudo com a droga. Nesses casos a internação, compulsoriamente ou voluntariamente, salva vidas”, disse ele, acrescentando que a medida é “um dispositivo de saúde publica importante, mas tem diferenciação”.
O professor critica o tempo e as condições com que a alternativa tem se caracterizado. Ribeiro afirma que o tempo de internação não pode se prolongar por meses, como o que foi constatado nas unidades no Rio.
“No Rio de Janeiro as crianças ficam meses. Em relação a isso, sou contrário. Mas, aquilo não é internação compulsória é serial killer a manutenção de uma pessoa internada e ficar lá durante meses”, avaliou.
A medida foi adotada no Rio de Janeiro em maio do ano passado, sob fortes críticas de movimentos ligados aos direitos da infância e aos direitos humanos. Na época, representantes do governo da capital fluminense argumentaram que a ação do Poder Público tinha como objetivo garantir a integridade física dos jovens. A justificativa foi respaldada, inclusive, em artigos do Estatuto da Criança e Adolescente, que asseguram o direito à vida e à integridade física. Para o governo local, seria inadmissível permitir que crianças e adolescentes usuárias de crack continuassem nas ruas, vulneráveis à prostituição e outros crimes sem que as autoridades agissem.
A internação compulsória está presente também em Belo Horizonte e em São Paulo.
O especialista em psiquiatria pela Universidade de Londres ainda contrapõe às correntes críticas quando se trata do financiamento das comunidades terapêuticas. “É um espaço de internação baseada no convívio, muitas vezes com viés espiritual. Este modelo também salva vidas para alguns pacientes. Às vezes, viver um período em uma comunidade com estrutura e regras é importante”, explicou.
O presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), Arles Gonçalves Júnior, explica que a internação compulsória está prevista em lei nacional [Decreto 891, de 1938] e independe da decisão dos governos locais. Segundo ele, o Poder Público tem o dever de “salvar a vida”. Mas a defesa do advogado limita-se, segundo ele mesmo, à questão jurídica.
“O país não tem condições de oferecer este serviço hoje. A saúde pública precisa se estruturar para atender, de forma digna, estas pessoas. Não posso pactuar com esta postura de pegar as pessoas à força e internar onde não vai ter o tratamento correto”, disse, destacando a falta de vagas para atendimento.
A alternativa apontada pelo advogado para que o Estado ofereça condições adequadas de tratamento seriam parcerias com a iniciativa privada. “E tem que fiscalizar para que não haja desvio de dinheiro e para que o tratamento aconteça realmente. O problema é que apesar de estar nas leis, os órgãos não fiscalizam.”
Para o coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, Pedro Paulo Bicalho, o que tem acontecido onde existe a política de internação compulsória é uma “atitude de recolhimento com a máscara do acolhimento.”
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21.09.2012 rev Época
ONG que trata usuários de crack é acusada de desviar verba
Parceira da prefeitura do Rio de Janeiro no programa de internação de viciados, a ONG Tesloo está sob suspeita de irregularidades
MAURÍCIO MEIRELES
Um dos mais controversos programas de combate ao crack completará um ano e meio de atividade. Adotado pela prefeitura do Rio de Janeiro, em maio de 2011, como resposta ao avanço de uma epidemia com graves impactos sociais, é o único no país que prevê internação compulsória de menores viciados. O caso do Rio conta com o apoio do governo federal e é apontado como inspiração para programas de combate ao crack em todo o Brasil – país que lidera o consumo de cocaína fumada no mundo, segundo uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
SUPERFATURAMENTO
Um menor viciado em crack é recolhido numa rua do Rio de Janeiro. 
(Foto: Fábio Teixeira / Ag. O Globo)
Uma investigação do Tribunal de Contas do Município (acima) aponta irregularidades num contrato de R$ 9,5 milhões 
Boa parte dos recursos municipais destinados ao programa está indo para a conta de uma ONG suspeita de superfaturar compras e de não executar parte dos serviços, de acordo com o Tribunal de Contas do Município (TCM) e com fiscais da própria prefeitura. A gravidade das suspeitas levou o Ministério Público do Rio de Janeiro a instaurar um inquérito para investigar o caso. A ONG chama-se Casa Espírita Tesloo. Fundada em 2002 por Sergio Pereira de Magalhães Junior, um PM reformado, com sede em Magalhães Bastos, na Zona Norte do Rio, tornou-se a principal parceira da prefeitura carioca na área social. A entidade administra três dos quatro abrigos municipais usados para o acolhimento compulsório de viciados, mas sua atuação vai além do crack. Desde 2005, a Tesloo assinou convênios que somam R$ 80 milhões. Pelo menos metade já foi paga à entidade. Essa profícua parceria com o Poder Público não aparece na página da ONG na internet. Nela, lê-se que toda doação é bem-vinda, pois a Tesloo diz que não recebe “nenhum subsídio garantindo a continuidade dos serviços por nós prestados à comunidade”.

Nos serviços prestados à comunidade com recursos públicos, a Tesloo falha. ÉPOCA teve acesso a um relatório sigiloso em que o TCM analisa um contrato de R$ 9,5 milhões, de 2009, e aponta a existência de superfaturamento – envolvendo compra de produtos de limpeza e higiene, além de comida, para as casas de acolhimento mantidas pela ONG. Os fiscais encontraram também notas fiscais irregulares e recibos suspeitos. Outro convênio, de R$ 6 milhões, assinado no ano passado, também apresentou problemas. A Tesloo deveria registrar e atualizar informações de 408 mil famílias no Cadastro Único dos programas sociais do governo federal. Entregou um relatório incompleto, com pouco mais da metade do objetivo cumprido. 

Ao visitar os abrigos da Tesloo, em 2009 e 2010, fiscais da Secretaria de Assistência Social relataram um cenário desolador: armários, camas e banheiros quebrados e sujos. Crianças dormiam no chão. A Casa Ser Criança, na Zona Oeste do Rio, não tinha psicólogo. Os fiscais constataram que um dos psiquiatras contratados nunca tinha ido ao abrigo. A internet e o telefone estavam cortados, por falta de pagamento. Em 23 de março de 2010, a coordenação encarregada da Casa Ser Adolescente, abrigo para viciados em Campo Grande, também na Zona Oeste, informou aos fiscais que a Tesloo não repassava os recursos para o bom funcionamento da unidade.

ÉPOCA visitou, no mês passado, a Casa Ser Adolescente. A chácara de um piso, com quartos e mobiliário simples, tem paredes com pintura descascada e janelas gradeadas. A piscina estava suja e sem proteção, como no relato feito dois anos antes por fiscais da prefeitura. Um relatório do Ministério Público do Rio de Janeiro sobre visitas realizadas nos dias 4 e 5 de setembro revela, em fotos, armários de ferro quebrados e sem portas. O abrigo Bezerra de Menezes, também mantido pela Tesloo e o primeiro visitado pela blitz do Ministério Público, apresentava mato acumulado nos jardins, colchões no chão e privadas sem assento.
Apesar do histórico problemático, a Secretaria de Assistência Social continuou fechando novas parcerias com a Tesloo. Assinou, neste ano, mais quatro convênios, num valor total de R$ 30,2 milhões, terceirizando o atendimento social e centros de acolhimento. Diante da gravidade dos fatos descobertos, o Tribunal de Contas do Município decidiu passar o pente-fino em todos os convênios da Tesloo com a prefeitura. A direção da ONG não respondeu ao pedido de entrevista de ÉPOCA e repassou a demanda à prefeitura. A Secretaria Municipal de Assistência Social afirmou, em nota, que “as deficiências do atendimento (nos abrigos da Tesloo) foram informadas à Tesloo no dia da fiscalização para as soluções cabíveis” e que esse é “um procedimento de rotina”. Para resolver o problema do superfaturamento nas compras, a Secretaria informa ter fixado limites de preço para a compra de alimentos, uma tentativa de coibir generosidade com dinheiro alheio. Diz ainda que tomará “todas as medidas cíveis e penais, se for o caso”. Que as eventuais irregularidades descobertas não atrapalhem uma causa tão importante quanto o combate à epidemia de crack.
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18/08/12 O Globo
‘Redução de danos para a plateia ver’, diz promotor
Metodologia do programa e abrigos carioca são criticados
RIO - A metodologia adotada pelo programa federal “Crack, é possível vencer”, conhecida como política de redução de danos, é mais um alvo de críticas. Não por não ser adequada, mas por não estar sendo implantada como era esperado.
Médicos, pesquisadores e promotores que atuam na área afirmam que o que se vê no trabalho de campo é bem diferente do que se faz em outros países que seguem essa mesma filosofia de combate às drogas — já reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto na Holanda o governo distribui seringas a viciados em heroína para diminuir o compartilhamento de agulhas e, consequentemente, a incidência de hepatite e aids, por exemplo, no Brasil faz-se a remoção contínua dos dependentes que padecem nas ruas. Um exemplo de que discurso e prática vêm se distanciando.
— Aqui, é contra a lei o Estado fornecer drogas. E não temos substâncias que substituem o crack. Então nossa redução de danos é para a plateia ver — diz Marcos Kac, promotor que coordena a seção de Justiça Terapêutica do Ministério Público Estadual do Rio.
— O Brasil está investindo muito dinheiro num negócio que comprovadamente não dá certo. A remoção continuada de viciados das ruas não funciona sozinha e tratar apenas quem se apresenta voluntariamente é pouco — diz Florencia Balestra, pesquisadora do Instituto Igarapé. — Se a taxa de recuperação dos viciados que querem se tratar é baixa, imagina daqueles que são obrigados.
Desde 31 de março de 2011, a Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio fez 94 ações em cracolândias cariocas. Nelas, foram registrados 4.706 acolhimentos. O GLOBO pediu aos envolvidos no programa federal dados oficiais sobre a reincidência de dependentes. Nenhum forneceu.
Na sexta-feira, um grupo compostos por profissionais dos conselhos regionais de Psicologia e Serviço Social do Rio, da PUC-Rio, do grupo Tortura Nunca Mais, da ONG Projeto Legal e da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) também apontaram problemas nos locais de tratamentos que funcionam na cidade. Num relatório feito com base numa visita realizada a quatro abrigos mantidos pela Casa Espírita Tesloo, que fica na Zona Oeste e é conveniada da prefeitura, o grupo aponta uma lista de deficiências. Entre elas, a “medicalização diária e generalizada”. Segundo o relatório, os dependentes dos quatro abrigos tomam por padrão quatro remédios diferentes todos os dias, além de injeções de Haldol e Fenergan (os chamados ‘Sossega Leão’).
— Haldol é um sedativo que diminui a atividade psíquica anormal como alucinações e delírios — diz o psiquiatra Jairo Werner. — Fenergan é um antialérgico que evita os efeitos colaterais do Haldol. O uso contínuo deles pode gerar sequelas como tremores.
Procurados pela reportagem, os administradores da Tesloo não retornaram.
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18/08/12 O Globo
Combate ao crack anda a passos lentos
Programa do governo federal esbarra na baixa adesão dos estados e na dificuldade de atendimento
Cristina Tardáguila / Vera Araújo
RIO - Na última quarta-feira, depois de ver o filho de 15 anos quebrar o espelho de casa durante uma crise de abstinência de crack, a faxineira X., de 49 anos, moradora da Zona Oeste do Rio, tentou buscar ajuda por telefone. Ligou para a Clínica de Recuperação Michelle de Moraes, em Santa Cruz, mas ninguém atendeu. Discou para o Centro Estadual de Assistência sobre Drogas (Cead), em São Cristóvão, e o telefone tocou sem parar. Tentou o Instituto Philippe Pinel, em Botafogo, mas também não teve resposta. Discou ainda para a Secretaria de Saúde de Niterói e, por 25 minutos, conversou com uma psicóloga. Desabafou, mas desligou sem solução. Quase chorando, X. apelou para o 1746, número da prefeitura do Rio conhecido por sanar questões que vão do controle de roedores a entulho. Da atendente, X. recebeu um protocolo e uma promessa: em dois dias o município retornaria. O prazo já expirou.
A via-crúcis de X. ao telefone aconteceu depois de ter recorrido ao Conselho Tutelar, à Vara da Infância e Adolescência e até à igreja evangélica. Também já havia pedido ajuda ao Hospital Lourenço Jorge, na Barra, onde levou o filho, mas não encontrou amparo. Há cinco meses, X. luta para salvar o adolescente, mas a situação só faz piorar.
— Até água eu tenho que pôr na boca dele — conta. — Tenho que trocar o lençol e bater o colchão toda hora, pois ele cisma que tem pregos. Tenho vergonha de dizer, mas dá vontade de chegar para um juiz e falar: “Já que vocês não me ajudam, vou abandoná-lo”.
A agonia de X. é comum. O crack avança pelo Brasil, e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, fala em “epidemia” nacional. Em dezembro do ano passado, a presidente Dilma Rousseff lançou com status de prioridade um programa federal para fazer frente à questão. Com orçamento de R$ 4 bilhões divididos entre os ministérios da Saúde, Justiça, Educação e Desenvolvimento Social, o programa “Crack, é possível vencer” vai até 2014 e tem como metas aumentar a oferta de tratamento, enfrentar o tráfico e ampliar a prevenção.
Nos primeiros oito meses, no entanto, pouco foi feito no quesito tratamento. Nas duas últimas semanas, O GLOBO solicitou, mas não obteve do Ministério da Saúde o número de atendimentos feitos pelo programa. O ministério alega que a contagem será feita a cada 12 meses e que a primeira será em março de 2013. Enquanto isso, ressalva, o controle é feito por visitas dos gestores às cidades contempladas.
Só um centro infanto-juvenil pronto
A execução orçamentária também anda devagar. Documento da Secretaria de Comunicação da Presidência da República informa que, de dezembro a março, o Ministério da Saúde autorizou o repasse de R$ 41,5 milhões. Ao todo, até 2014, a pasta terá direito a R$ 2 bilhões. O ministério diz que de dezembro de 2011 a junho de 2012 “executou R$ 378,6 milhões”, 19% do total.
A baixa adesão ao programa é outro ponto sensível. Só 12 estados aderiram ao programa. São Paulo, por exemplo, ainda não figura na lista oficial.
No que diz respeito às metas, o programa também avançou pouco. Dados do Ministério da Saúde apontam que, dos 3.600 mil leitos que seriam criados ou qualificados até 2014, só 79 funcionam. Das 188 unidades de acolhimento infanto-juvenil, só uma saiu do papel (em Vitória, no ES). Dos 323 consultórios de rua prometidos, só 74 abriram.
Entre as ações já realizadas, destaca-se, no entanto, o treinamento de mão de obra. Em todo o país, foram capacitados 13 mil auxiliares de enfermagem e 177 mil agentes comunitários de Saúde, além de 500 profissionais de nível superior e 30 mil alunos de graduação.
— O programa está indo muito bem, tomando como base que as metas são ambiciosas — defende Leon Garcia, coordenador adjunto de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do ministério: — Antes o problema das drogas era visto isoladamente. Hoje, estão envolvidos vários ministérios.
O município do Rio, onde X. vive, recebeu R$ 20 milhões do programa. Com a verba, a Secretaria Municipal de Saúde diz que 30 de seus 120 profissionais de Saúde mental foram treinados em 2011 e que outros 50 serão beneficiados até o final deste ano. Além disso, foram criados dois centros de atenção psicossocial, três consultórios de rua e duas emergências psiquiátricas — no hospital Lourenço Jorge e na Policlínica Rodolfo Rocco, em Del Castilho.
De acordo com a Secretaria de Saúde, X. não conseguiu ser atendida ao ligar para o Pinel porque a linha do instituto estava com defeito. Responsável pelo Cead e pela clínica de Santa Cruz, a Secretaria Estadual de Assistência Social diz que a falta de informação contribuiu para o não atendimento.
— Em caso de surto, deve-se recorrer à polícia ou ao Samu — diz Leonardo Pecoraro, do Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas.
Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde de Niterói não explicou por que não pôde atender ao adolescente.
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17/08/2012 G1
Relatório denuncia encarceramento e dopação de menores em abrigos do Rio.
Conselhos de psicólogos e assistentes sociais elaboraram documento. Profissionais põem em xeque a política de recolhimento compulsório.
Os conselhos regionais de Psicologia (CRP-RJ) e Serviço Social (CRESS-RJ) do Rio de Janeiro divulgaram relatório, nesta sexta-feira (17), em que apontam encarceramento e dopação de crianças e adolescentes nos abrigos da Prefeitura do Rio. Os conselhos visitaram quatro abrigos na Zona Oeste da cidade, onde crianças e adolescentes são recolhidos compulsoriamente por conta do uso de álcool e drogas, especialmente o crack.
Os conselhos consideram o quadro "preocupante" e põem em xeque a política de recolhimento compulsório do município.
Entre outros pontos críticos, o relatório cita: "isolamento, medicalização descontrolada, falta de informações sobre resultados, orientação religiosa, confusão entre saúde e assistência e violação de diretrizes dos ministérios da Saúde (MS) e de Desenvolvimento Social (MDS)".
Segundo o relatório, as unidades são geridas pela ONG Casa Espírita Tesloo, que seria presidida por um policial militar reformado e teria os contratos questionados pelo Tribunal de Contas do Município (TCM). O valor dos contratos somaria R$ 67 milhões somente na gestão de Eduardo Paes, alerta o documento.
As entidades que participaram das fiscalizações alertam para o regresso à "lógica manicomial de internação no Rio de Janeiro e para uma “confusão deliberada entre saúde e assistência”.
Além dos dois conselhos, participaram das visitas e da elaboração do documento o Núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio, o Grupo Tortura Nunca Mais e a ONG Projeto Legal, além da Comissão de Direitos Humanos e de organismos de prevenção e combate à tortura da Assembleia Legislativa. Um total de 27 profissionais participou do trabalho. As visitas foram feitas em maio de 2012, em quatro abrigos especializados, em Campo Grande e Guaratiba.
Sobre o isolamento e encarceramento, o documento diz: "Há uma limitação para contato telefônico com a família que varia entre apenas um ou dois dias por semana, dependendo do abrigo, bem como apenas um ou dois dias para visitação. As crianças e adolescentes passam o dia inteiro no abrigo, com raríssimas atividades externas, e ficam proibidos até mesmo de ir à escola".
O relatório denuncia a “medicalização diária e generalizada" nas quatro instituições vistoriadas. "As equipes foram informadas que os garotos abrigados tomam, por padrão, quatro tipos diferentes de medicamentos diariamente, além de injeções compostas por Haldol e Fenergan (os chamados ‘SOS’ ou ‘Sossega Leão’)", diz o documento. Os profissionais afirmam também que medicamentos iguais são usados na mesma dosagem em meninos de diferentes idades e complexões físicas, "sem que sejam levados em conta aspectos psicológicos e socioculturais".
A reportagem do G1 procurou a Secretaria municipal de Assistência Social, que ficou de dar uma resposta, mas até o fechamento desta reportagem não havia dado o retorno.
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23.07.2012 O Dia
De cada 10 mulheres recolhidas em cracolândias no Rio, oito estão grávidas.
PAMELA OLIVEIRA
Rio -  Tainá e Luciana (nomes fictícios), 19 anos. A mesma idade, a mesma história. Elas mergulharam no crack e engravidaram Uma luta contra a dependência química e sonha em reaver o filho, que vive em abrigo. A outra perdeu a batalha: fugiu de clínica já com barrigão.
A gestação que surge a partir da vida que escoa no vício é realidade cada vez mais comum no Rio. Hoje, de cada dez mulheres apreendidas nas cracolândias, oito estão grávidas, segundo estima Ana Carolina Freitas, educadora que atua nas operações da Secretaria Municipal de Assistência Social.
A notícia da gravidez não afasta a mulher da droga. Muitas sequer percebem que esperam bebês e são surpreendidas com a revelação já no fim da gestação, geralmente prematura, afirmam assistentes sociais.
“A maioria das garotas que recolhemos nas cracolândias estão grávidas. Elas não sabem quem são os pais porque geralmente se prostituem para ter pedras de crack e não se cuidam. Às vezes, a gente recolhe a mulher com um barrigão e, meses depois, ela está novamente lá. Quando perguntamos, ela diz que o bebê ficou na maternidade ou está com o Conselho Tutelar. O crack para elas é mais forte do que a maternidade”, conta Ana Carolina.
Perda da guarda
O DIA revelou neste domingo que o uso de crack por mães e pais já fundamenta a maioria dos pedidos de destituição do poder familiar feita pelo Ministério Público estadual no Rio de Janeiro.
Em caso de bebês afastados de suas famílias pela Justiça, a frequência é ainda maior, alcança 90% dos casos.Internada em maio com cinco meses de gestação na Clínica Ricardo Iberê Gilson, em Valença, Tainá sucumbiu à agonia da abstinência.
Sem poder ingerir os mesmos medicamentos e dosagens que outros pacientes, por conta da gravidez, fugiu com o filho na barriga pela terceira vez.
Ela fora internada após apelo da família à Justiça. Tainá abandonara o lar para viver em cracolândias e não sabe quem é o pai da criança.
Luciana visita Victor toda semana no abrigo. Em luta contra o crack, ela se esforça para poder recuperar a guarda
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
“Acho que meu filho vai ser meu companheiro contra a droga. Espero uma vida melhor para ele. Quero muito ficar com meu filho, cuidar dele”, disse ela na semana de sua internação. A manutenção da guarda da criança estava condicionada a um relatório que a instituição teria que enviar à Justiça quando nascesse.
“A última informação que a família dela tem é a de que ela estaria em São Paulo. Ela ligou para a mãe para dizer que não era para se preocupar porque estava bem. Não sabemos se a criança já nasceu. A mãe dela está desesperada”, conta Rozane Gonçalves Pinto, diretora da clínica.
Ela revela que Tainá atravessava o período mais difícil do tratamento quando abandonou tudo.
Luta em nome do filho
O crack levou Luciana para as ruas. Mesmo quando soube da gravidez, continuou na cracolândia do Jacaré, de onde foi levada, às pressas, para dar à luz Victor (nome fictício), no Hospital Geral de Bonsucesso, há seis meses.
Ela descobriu a gestação ao ser socorrida num posto de saúde. “Na época, eu não queria ter um bebê. Continuei usando crack”, desabafa a jovem, que visita Victor toda semana na Casa de Passagem Ana Carolina, em Bonsucesso.
Desde que ele nasceu e foi para o abrigo, ela luta contra a droga: “Tudo que eu quero é levar meu filho comigo. Antes, eu não pensava no futuro, era só a droga”.
Psicóloga da casa, Celina Freitas acompanha a evolução de Luciana, que se diz livre do vício: “No início, ela vinha do Jacaré, suja, com fome. Hoje, tem outra postura, é apaixonada por esse filho e isso está ajudando muito”.
Em busca da guarda
Hoje sem a guarda do filho, Luciana pode recuperá-la se provar sua recuperação. “Nada impede que isso ocorra. Se a mulher abandonou o recém-nascido na maternidade, não o procurou e só voltou três meses depois, para mim é um caso irreversível porque você não vira as costas para um filho e volta depois. Mas se essa mãe não fugiu do hospital e começa a fazer tratamento contra a droga, é um caso diferente”, explica a promotora Ana Cristina Macedo.
Algumas dessas mães não viveram a vida toda na rua, têm família que pode ajudá-las a se livrar do vício, pondera a promotora.
“Tivemos o caso de uma mulher que era esclarecida e queria muito aquele filho. Ela ficou no hospital, ajudou as enfermeiras, foi protetora. Na audiência, eu fiquei até comovida. Então você vê que a maternidade pode fazer a pessoa mudar. É possível, mas não é a maioria”, revela Ana Cristina.
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26.07.2012 O Dia
ONGs que acolhem viciados e são investigadas por receberam R$ 103 milhões da prefeitura
ADRIANA CRUZ
Rio -  Elas atuam na acolhida a dependentes químicos e moradores de rua, têm contratos questionados pelo Tribunal de Contas do Município (TCM), mas já receberam R$ 103.631.471,57 dos cofres públicos da Prefeitura do Rio em três anos.
As ONGs Tesloo, Obra de Promoção dos Jovens e Central de Oportunidades são acusadas de superfaturamento na compra de alimentos. Nesta quarta-feira em ação de combate ao crack nas favelas do Jacarezinho e Pica-pau, 66 pessoas foram recolhidas, entre elas, mais uma grávida.
No Jacarezinho, agentes flagraram homens dormindo nas ruas
Foto: Rodrigo Melo de Carvalho / SMAS
Desde de domingo, O DIA  mostra que gestantes viciadas abandonam os filhos na maternidade ou perdem a guarda deles. O uso de crack pelos pais é a principal motivação das ações do Ministério Público estadual de destituição do poder familiar. Nos processos que envolvem bebês, o índice chega a 90%. A estimativa é que 80% das mulheres retiradas de cracolândias estejam grávidas.
 Desperdício
Enquanto o número de usuários de crack se multiplica, há desperdício de dinheiro público em contratos de ONGs que cuidam de dependentes.
A Casa Espírita Tesloo é a recordista de convênios com a Secretaria de Assistência Social (SMAS). O órgão informou que são R$ 79,2 milhões em contratos de 2009 a este ano: R$ 37 milhões já foram pagos.
A ONG pagou R$ 64,50 por cinco molhos de salsa ano passado, 10 vezes a mais que o cobrado em supermercados. A Tesloo apresentou notas fiscais de compras de alimentos que não eram vendidos pelo seu fornecedor, a Cerealista Amazonas Ltda. O Ministério Público investiga a entidade.
 Um contrato, R$ 29 milhões
A ONG Obra de Promoção dos Jovens ocupa o segundo lugar no ranking de contratos com SMAS. São R$ 56,3 milhões dos quais R$ 29,6 milhões já foram pagos.
A entidade também teve irregularidades na prestação de contas identificadas pelo TCM, como o desperdício na compra de alimentos. “Não existe corrupção sem o envolvimento de servidores, operadores de ONGs e empresas”, disse Cláudio Rangel, professor de Administração Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Outra grávida recolhida em cracolândia
Principal cracolândia da cidade, o Jacarezinho já foi alvo de 28 operações de combate à droga em um ano e meio. Nesse período, 1.667 pessoas foram recolhidas pela Secretaria Municipal de Assistência Social. Na ação de ontem, mais uma grávida foi encontrada pelos agentes.
Na segunda-feira, três gestantes foram retiradas de outros pontos de consumo na Zona Norte. Uma delas jamais tinha feito pré-natal, não sabia o tempo de gestação e nem quem é o pai de seu filho.
Desde 31 de março de 2011, quando começaram as operações conjuntas da secretaria com órgãos de segurança, houve 94 ações em cracolândias cariocas. Foram acolhidos 4.706 pessoas que vagavam nesses locais, das quais 663 eram crianças ou adolescentes.
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25.07.2012 O Dia
Ministério Público vai investigar ONG
Adriana Cruz e Diogo Dias
Rio -  Ministério Público estadual abriu inquérito civil para investigar os contratos da Casa Espírita Tesloo com a Secretaria de Municipal de Assistência Social.
      Como O DIA  revelou nesta terça-feira, relatório do Tribunal de Contas do Município constatou irregularidades em dois convênios da organização não governamental, como superfaturamento na compra de alimentos.
Cinco molhos de salsa que custam R$ 6,50 foram adquiridos por R$ 64,50. Só este ano, a secretaria assinou mais dois convênios com a Tesloo no valor de R$ 23,5 milhões para o acolhimento de menores dependentes químicos e moradores de rua.
O tribunal identificou ainda irregularidades em convênios com a Associação Projeto Roda Viva Construção da Cidadania da Criança, Obra de Promoção dos Jovens e Central de Oportunidade.
Na prestação de contas da Central de Oportunidades, há três faturas de telefone no valor de R$ 20.476,98. Para os inspetores do TCM, não há justificativa para a despesa, que sequer está prevista no convênio.
Operação em Manguinhos retirou 88 das ruas
Com um cigarro nas mãos, uma criança de 8 anos assistia com naturalidade uma operação em cracolândias da Zona Norte.
Isso aqui não é crack, doutor. É só um cigarrinho comum”, argumentou a um dos policiais o menino acolhido. A ação retirou ontem 16 menores e 71 adultos das favelas do Jacarezinho, Manguinhos e Arará, em Benfica, entre eles três gestantes. Armada, uma delas foi presa.
O número de grávidas em cracolândias impressionou os agentes. Segundo eles, a quantidade deve ser ainda maior já que muitas viciadas não sabem que esperam um bebê.
Como O DIA tem mostrado ao longo da semana, grande parte abandona ou perde a guarda do filho ao dar à luz.
O uso de crack pelos pais já é a principal motivação das ações de destituição de poder familiar, segundo o Ministério Público estadual.
Durante a ação, gestante de 22 anos foi presa com uma amiga por tráfico de drogas, associação para o tráfico e posse ilegal de arma de uso restrito. A polícia encontrou com elas uma pistola calibre 9mm, 2 carregadores municiados, 611 pedras de crack e 66 sacolés de cocaína.
 Grávida foi retirada da cracolândia de Manguinhos por assistentes sociais durante ação da Polícia Civil
Foto: Tânia Rego / ABR
Essa gestante não sabe quanto tempo tem de gravidez e não faz ideia de quem é o pai. Ela disse que não procurou médico para o pré-natal. A criança já nasce vítima do crack”, lamenta um policial civil que prefere não ser identificado.
O garoto de 8 anos que vimos lá parecia vivido, acostumado com aquele mundo. As crianças são vítimas. Muitas veem a família caída por causa da droga”, comenta o delegado Marcello Braga Nunes, titular da Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV), responsável pela operação.
Policiais da especializada contam que muitas crianças buscam refúgio nas cracolândias por sofrerem maus-tratos em casa. “Elas preferem ficar na rua porque sofrem agressões ou são abusadas por familiares”, relata policial que participou da operação.
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G1 RJ 18/07/2012
Consumo de crack se espalha pelas ruas do RJ

Cerca de 3 mil usuários buscam a droga em 11 cracolândias da cidade. Polícia diz que proibição do uso nas favelas espalha o movimento nas ruas.
O consumo de crack está se espalhando pelas ruas do Rio. Principalmente, depois que traficantes começaram a proibir o consumo em algumas favelas da cidade para evitar a ação da polícia nas comunidades.
Às 8h30, muitos usuários de crack estão num sono pesado depois de passar horas consumindo drogas, na cracolândia do Jacarezinho, no Jacaré, no subúrbio do Rio, a maior da cidade. Eles dormem em qualquer canto: junto aos carros, no meio do lixo, amontoados, como mostra reportagem do RJTV.
Aos poucos eles acordam e dão início à mesma rotina do vício: usam um copo de plástico como cachimbo, e um isqueiro para queimar a pedra.
Os pontos de consumo se espalharam para além do Jacarezinho. Pessoas totalmente dependentes da droga foram flagradas em ruas de Bonsucesso, Higienópolis e Benfica, no subúrbio, onde fumam ao lado dos moradores.
Um levantamento feito pela Secretaria municipal de Assistência Social identificou cerca de três mil usuários de crack que ficam perambulando pelas ruas em busca da pedra mais barata. Ainda de acordo com o mapeamento, o Rio tem atualmente, pelo menos, 11 cracolândias em diferentes bairros da cidade.
Se antes a linha do trem, em Manguinhos, no subúrbio, por exemplo, era um local muito visado pelos usuários, agora, com as obras de suspensão dos trilhos, um antigo caminho do trem se transformou, ao lado da Rua Leopoldo Bulhões, se transformou em território de usuários da droga. Por causa da chuva nesta quarta-feira (18), muitos montaram barracas embaixo do viaduto.
Na rua, dois jovens, um deles de uniforme escolar, passam o copo plástico de um para o outro. Uma pesquisa feita pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) ouviu 61 adolescentes com idades entre 12 e 18 anos. Todos dependentes de drogas.
Os números relacionados ao crack espantam. Segundo a pesquisa, 66% eram usuários da pedra, 25% fumavam maconha e 5% eram dependentes de cocaína. Ainda de acordo com a pesquisa, para sustentar o vício do crack eles chegam a gastar R$ 740 por semana.
Eles muitas vezes assaltam motoristas e pedestres: 63% dos dependentes de crack assumem roubar a mão armada para conseguir dinheiro rápido. Nas redondezas de uma cracolândia, há sempre histórias de crimes praticados por dependentes de crack.
“Tentaram me pegar a carteira, eram garotos, não eram adultos não”, disse um homem que não quis se identificar.
Segundo a polícia, a expansão das cracolândias está ligada à restrição imposta por traficantes. De acordo com os agentes, muitos criminosos começaram a proibir o consumo nos arredores das favelas. Seria uma forma de evitar problemas com a polícia perto da comunidade.
A equipe do RJTV conversou com um PM que confirma a proibição em comunidades do Conjunto de Favelas da Maré e de outras regiões da cidade.
“Os próprios cracudos, vulgo cracudo, estavam usando o entorpecente lá dentro e roubando as próprias pessoas da favela. por isso foi proibido. Favela da Maré, Parque União, Manguinhos, Jacaré, todo local que tem crack, está havendo essa represália em relação a isso”, disse o PM.
Imagens mostram uma mulher aparentemente grávida, que saiu da Favela do Jacarezinho. E só começa a fumar a pedra quando já está distante da comunidade, junto com outras quatro pessoas. O consumo do crack cada vez mais se espalha pela cidade.
Proibição de consumo nas favelas
A delegada Valéria Aragão, da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), diz que ainda está observando se os usuários foram proibidos por traficantes de consumir crack nas comunidades,.
“Não podemos esperar que o tráfico cumpra com a sua palavra. Eles não estão fazendo isso por uma preocupação moral e com a saúde dos usuários, mas sim por uma visão empresarial do seu lucro. Eles estão vendo se vale a pena correr o risco de operações policiais que são atraídas para as comunidades”, disse a delegada que compara a lucratividade do crack com a venda de maconha e cocaína.
Segundo a delegada, o usuário do crack – diferentemente de usuário de outras drogas, que faz o uso controlado de substâncias – é compulsivo. Eles chegam a fumar 30 pedras por dia. Ela diz que o número de usuários de crack está crescendo e, embora eles tenham uma sobrevida curta, a substituição dos dependentes é rápida.
Valéria Aragão diz que a polícia vem fazendo ações de inteligência no combate ao crack, que às vezes não têm resultados rápidos, mas que são mais eficazes. Na semana passada foram feitas três operações, nas favelas do Jacarezinho, Manguinhos e Mandela, com prisão de seis traficantes e apreensão de cinco mil pedras de crack.
“Temos informações de que ao menos a maior facção criminosa do Rio está se mobilizando para interromper a venda do crack, após o término de seus estoques, justamente para evitar as ações policiais tão constantes. Eles querem evitar essa visibilidade toda que o usuário do crack traz, que consome a pedra ostensivamente, escancaradamente, atacando populares”, destacou a delegada.
Daphne Braga, da Secretaria municipal de Assistência Social (SMAS) destaca que crianças e adultos são acolhidos compulsoriamente e levados para abrigos, quando encontrados em situação de rua. Ela diz que vai ampliar o atendimento aos usuários, com o apoio da polícia.

4 comentários:

  1. Ninguém olha para a privação dessas mães. São excluídas da sociedade e não têm direito nenhum respeitado. O estado apenas volta os olhos para essas mães no momento de condená-las e puní-las.
    É assim que querem resolver o problema do crack, que é apenas um mero detalhe na vida dessas mães.

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  2. é o crack que está "tirando" crianças das famílias?
    Como?

    Por exemplo essa parte da reportagem:
    “Segundo ela, antes do crack, as ações de destituição do poder familiar eram motivadas por maus-tratos, violência física e sexual: “Agora, isso tudo vem acoplado ao crack. A pessoa passa a ser agressiva e negligente por causa da droga. Antigamente, era negligente porque era. Ou porque bebia ou usava cocaína. Não tenho mais nada disso. Agora é crack”.”
    Na minha leitura, isso afirma que a pobreza, miséria e falta de recursos e falta presença do Estado ANTES, acabou abrindo espaço para a dependência de crack dos genitores. E o Estado chega com a polícia e conselho tutelar quando a situação já está insustentável e é de fato, necessária a separação da família.
    Outra parte que quero comentar:
    “O consumo do crack na gravidez e todas as consequências da droga, como a desnutrição das mães, deixa herança ingrata para bebês: problemas respiratórios, sífilis congênita e HIV (vírus da Aids).”
    Desnutrição nas mães tem mais a ver com miséria e falta de recursos que com crack. Ações de Redução de Danos poderiam ter oportunizado aproximação de agentes que estariam atentos à alimentação, hidratação e profilaxia quanto a DSTs ANTES.
    A ação do crack no organismo humano é de fato, devastadora. Preocupo-me, porém, com afirmações que personificam a substância como se ela tivesse vontade própria, e colocam na conta dela toda a miséria, abandono e falta de ação pública, que nos acompanham desde antes da década de 90 (chegada do crack), e é possível dizer, que oportunizam a popularização desse produto de ação tão eficiente e rápida para quem consome, além do custo competitivo - barato (o crack).

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    1. Obrigado Aline.
      Caso vc tenha algum artigo sobre o tema, nos envie.
      Felicidades!

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